A crise do Facebook e o uso de mídias sociais como fonte de informação



Roberto Luiz do Carmo*
Kelly C. M. Camargo**

As recentes descobertas sobre fraudes e as notícias falsas que se tornam virais nas redes sociais suscitaram nossa reflexão sobre o que está acontecendo, sobretudo, com o Facebook. Deste modo, vale conhecer a origem do problema da utilização de informações das redes sociais para influenciar a sociedade.

Fonte: https://digitalks.com.br/noticias/pesquisa-revela-tendencias-e-praticas-adotadas-pelas-empresas-nas-redes-sociais/

Destaca-se que essa discussão não é nova, Goebbells, ministro da propaganda de Hitler, foi um dos primeiros a utilizar a propaganda como instrumento de criação de uma visão da realidade, capaz de mobilizar o sentimento das pessoas. É dele a célebre frase: "Uma mentira repetida muitas vezes se torna uma verdade". E essa ideia é uma parte do que sustenta a relevância das "fake news" de hoje em dia.
Sobre os "likes" no Facebook, já foram realizados vários experimentos mostrando o que eles são na realidade. Como ressalta o artigo da Superinteressante1, os “likes” ou as “curtidas” podem ser uma fraude. Isso nos faz indagar como figuras como Whindersson Nunes se tornam uma das personalidades mais "influentes" da internet. Outro exemplo de como pode ser difícil verificar o que é ou não é verídico, temos as avaliações do site Trip Advisor que levaram um restaurante inexistente ao topo da lista dos melhores de Londres2.
Nesse contexto, é interessante analisar o crescente movimento de se deletar as contas no Facebook3. Trata-se de uma tendência que ainda está começando, e que provavelmente levará Mark Zuckerberg, fundador do Facebook, a reforçar o que ele já vem fazendo: trazer a rede social para o campo da troca de informações entre familiares e amigos, a chamada "orkutização".
Paradoxalmente, nesse cenário, os movimentos sociais que se utilizam do Facebook para comunicação e organização de ações coletivas seriam também afetados. É interessante, sob essa perspectiva, pensar em como as iniciativas no sentido de ampliar a comunicação e a discussão de ideias paulatinamente se transformam no seu oposto. De certa forma, isso não foge do que já havia sido discutido por Adorno e Horkheimer no livro "Dialética do Esclarecimento"4, no qual os autores mostram exatamente essa capacidade do sistema capitalista.
Destaca-se também o artigo que sintetiza as potencialidades das informações do Facebook, escrito por Kosinsk, Stillwell e Graepel5, e publicado na PNAS -, uma importante revista científica dos EUA. Destacam-se dois parágrafos das conclusões do artigo:

“Mostramos que uma grande variedade de atributos pessoais dos usuários das redes sociais, que vão desde orientação sexual a inteligência, podem ser automaticamente inferidas com precisão usando as preferências dos indivíduos no Facebook. As semelhanças entre os ‘likes’ do Facebook e outros tipos de registros, como históricos de navegação e consultas de pesquisa, sugerem que o potencial para revelar tais particularidades dos usuários não está limitado aos ‘likes’. Além disso, a grande variedade de atributos previstos neste estudo indicam que, tendo treinamento para trabalhar com os dados, pode ser possível revelar outras informações” (Tradução Nossa).


“Por outro lado, a possibilidade de se prever os atributos individuais dos usuários a partir de registros digitais de comportamento podem ter consideráveis implicações, porque é possível aplicar essa ação a um grande número de pessoas sem se obter consentimento e sem que elas percebam. Então, empresas comerciais, instituições governamentais ou até mesmo amigos do Facebook podem usar um software para inferir atributos como inteligência, orientação sexual ou visões políticas que o indivíduo não queira compartilhar. Com isso, imagina-se situações em que tais previsões, mesmo que incorretas, ameacem o bem-estar, liberdade ou até mesmo à vida de um usuário da rede social. Importante destacar que dada a quantidade cada vez maior de vestígios digitais, torna-se difícil para os indivíduos controlar qual dos seus atributos estão sendo revelados. Por exemplo, não compartilhar conteúdo homossexual pode ser insuficiente para prevenir outros de invadir a privacidade da pessoa e descobrir sua orientação sexual” (Tradução Nossa).

Ao que parece, tudo o que se previa como o pior cenário possível, acabou acontecendo.

Fonte: http://detetivelira-pi.com.br


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*Professor Associado do Departamento de Demografia (IFCH/Unicamp).
** Doutoranda em demografia e cientista social (IFCH/Unicamp).

1 GARATTONI, Bruno. As verdades sobre os likes. Revista Superinteressante, 29 de maio de 2017. Disponível em: https://super.abril.com.br/comportamento/a-verdade-sobre-os-likes/
2 ROSENBERG, Eli. Restaurante falso em Londres chega ao topo de ranking em site de viagens. Folha de S. Paulo, 13 de dezembro de 2017. Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/turismo/2017/12/1943141-restaurante-que-nao-existe-chega-ao-topo-do-tripadvisor-em-londres.shtmlA história toda dessa "pegadinha" está aqui:BUTELER, Oobah. I Took TripAdvisor's Harshest Reviewers Out and Reviewed Them. VICE, 15 de junho de 2017. Disponível em: https://www.vice.com/en_uk/article/j5xb97/i-took-tripadvisors-harshest-reviewers-out-and-reviewed-them
3 Usuários abandonam Facebook após escândalo sobre dados privados. UOL Notícias, 23 de março de 2018. Disponível em: https://noticias.uol.com.br/midiaglobal/nytimes/2018/03/23/usuarios-abandonam-facebook-apos-escandalo-sobre-dados-privados.htm?news=true
4 ADORNO, Theodor W.; HORKHEIMER, Max. Dialética do esclarecimento: fragmentos filosóficos. Tradução de Guido Antonio de Almeida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, p. 99-138, 1985.
5 KOSINSKI, Michal; STILLWELL, David; GRAEPEL, Thore. Private traits and attributes are predictable from digital records of human behaviorProceedings of the National Academy of Sciences, v. 110, n. 15, p. 5802-5805, 2013.

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